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Unesco faz recomendação inédita para uso ético da neurotecnologia

Orientações entram em vigor no dia 12 de novembro próximo

Uma tecnologia capaz de monitorar o funcionamento do cérebro humano e até mesmo de modificar a atividade cerebral. Em todo o mundo há dezenas de milhares de pessoas usando a neurotecnologia. Ela está em implantes cocleares,que são próteses eletrônicas utilizadas para restaurar a audição em pessoas com déficit funcional ou estimuladores cerebrais para tratar doenças como Parkinson ou depressão.

O uso da neurotecnologia não se restringe, no entanto, à medicina. Ela pode ser usada na educação, por exemplo, para melhorar a memória. Os benefícios são muitos. Mas há também riscos. Esses dispositivos são capazes de captar e armazenar diversas informações pessoais, os chamados neurodados, que precisam ser protegidos. Sem controle ético, podem inclusive transmitir propagandas de produtos aos usuários.

Uma tecnologia com acesso direto ao cérebro humano, às emoções e à personalidade, precisa de atenção dos governantes de todo o mundo e de regulamentação, de acordo com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Nesta quarta-feira (5), a Conferência Geral da Unesco aprovou a primeira recomendação sobre a ética da neurotecnologia, que deverá ser observada pelos 194 países membros da organização, entre eles o Brasil. O documento entra em vigor no dia 12 de novembro, ao final da conferência geral, que está sendo realizada em Samarcanda, no Uzbequistão.

Trata-se do primeiro quadro normativo global sobre a ética da neurotecnologia. Em entrevista à Agência Brasil, a diretora-geral adjunta de Ciências Humanas e Sociais e Ciências Naturais, Lídia Brito, explica que a normativa busca chamar atenção para a tecnologia e para os possíveis riscos que ela pode vir a ter.

“No mundo em que vivemos hoje, com avanços muito rápidos de várias tecnologias emergentes, esse papel da Unesco é cada vez mais importante, porque, de alguma maneira, é uma antecipação de possíveis riscos aonde uma base ética pode reduzir e mitigar os imprevistos do avanço tecnológico”, diz.

Riscos

Segundo o texto, os países estão em fases diferentes da implementação da tecnologia. A intenção é até mesmo antecipar riscos de usos que podem ainda nem estar em vigor.

“É preciso criar um arcabouço ético e um instrumento que põe claramente, por um lado, definições globalmente aceitas, que estão ligadas à neurotecnologia, mas também os princípios e valores que têm que orientar o desenvolvimento desta tecnologia em todos esses campos”, diz a diretora-geral.

“É o instrumento global onde se acorda uma série de definições importantes para que, depois, os princípios éticos possam ser aplicados em todo o ciclo da tecnologia.”

Além de trazer definições do que é neurotecnologia, neurodados e outros termos relacionados, o documento chama a atenção de governos, para que garantam que a técnica permaneça inclusiva e acessível, estabelecendo salvaguardas para preservar a integridade da mente humana.

Neurotecnologia; neurociência; cérebro; tecnologia cerebral; saúde tecnológica; inteligência artificial. Foto: DC Studio/Freepik
Recomendação destaca a necessidade urgente de melhor regulamentar os produtos que possam influenciar o comportamento. Foto: DC Studio/Freepik

O instrumento normativo identifica riscos como violações da privacidade mental e alerta para o uso da tecnologia no ambiente de trabalho, a fim de monitorar a produtividade ou criar perfis de dados sobre os funcionários, e insiste na necessidade de consentimento explícito e total transparência.

A recomendação destaca a necessidade urgente de melhor regulamentar os produtos que possam influenciar o comportamento ou promover o vício, garantindo que informações claras e acessíveis sejam fornecidas aos consumidores.

O documento desaconselha o uso não terapêutico para crianças e jovens, cujos cérebros ainda estão em desenvolvimento.

Brito reforça que se trata de uma recomendação, ou seja, a aplicação pelos países não é obrigatória. Ela destaca também que não se trata de proibir o uso dessas tecnologias, mas sim de ter cuidados éticos para que o uso respeite os direitos das pessoas.

“Não é proibição, de maneira nenhuma, até porque é uma tecnologia que pode trazer muitos benefícios às pessoas, incluindo as crianças e adolescentes, é ter os cuidados éticos para que essa utilização respeite os direitos dessas crianças, desses adolescentes e também proteja essas crianças e esses adolescentes”, diz.

Transparência

Entre as recomendações aos estados-membros é que sejam asseguradas a transparência e a responsabilização no apoio, supervisão e regulamentação da neurotecnologia, em particular em iniciativas financiadas com fundos públicos, como pesquisas na área da saúde mental, do cérebro e da saúde cerebral, e programas de pesquisa e desenvolvimento na área da saúde em geral.

Os governos devem exigir que os projetos divulguem publicamente os objetivos, as metodologias, as utilizações previstas, os resultados, os riscos potenciais, os riscos identificados e os impactos sociais das suas iniciativas de neurotecnologia, assim que a informação seja adequada para divulgação pública.

A transparência é crucial para fomentar a confiança pública e garantir que os avanços da neurotecnologia estejam em conformidade com as normas éticas estabelecidas nesta recomendação e com o direito internacional, incluindo o direito internacional dos direitos humanos.

Neurodados

Segundo o documento, os estados-membros devem desenvolver quadros regulamentares e jurídicos robustos, justos e ágeis para reger a coleta, o tratamento, a partilha e todas as outras utilizações de dados neurais, bem como de dados neurais indiretos e de dados não neurais que permitam inferências sobre estados mentais, conforme apropriado.

Os quadros, novos e existentes, devem considerar tanto os dados neurais como os dados neurais indiretos e os dados não neurais que permitam inferências sobre estados mentais como dados pessoais sensíveis.

Educação

A neurotecnologia para fins de otimização de desempenho não terapêutico não deve ser utilizada em crianças com saúde e função cognitiva plenas, conforme definido pela Organização Mundial de Saúde (OMS), entendidas como pessoas com menos de 18 anos, diz o texto.

O uso da neurotecnologia nesta área pode ser permitido para certos fins pedagógicos legítimos, como auxiliar alunos com dificuldades de aprendizagem, incluindo pessoas com deficiência ou condições cognitivas, ou promover a alfabetização tecnológica, desde que seja compatível com os direitos humanos, a saúde, o bem-estar e a não discriminação dos alunos, bem como com seu consentimento prévio, livre e informado, ou anuência, conforme o caso.

Tais usos também devem ser baseados em evidências, avaliados previamente, corresponder a objetivos educacionais legítimos e ser limitados ao necessário para atingir tais objetivos. Os Estados-Membros devem ser incentivados a desenvolver diretrizes nacionais para esse fim.

Consumidores

De acordo com o documento, os estados-membros e outros intervenientes relevantes devem adotar políticas para prevenir o uso indevido ou abusivo da neurotecnologia para os consumidores, especialmente os neurojogos e jogos de azar, bem como outros dispositivos que exploram o sistema de recompensa da dopamina ou que visam induzir o uso problemático e prejudicial e o consumo excessivo.

As regulamentações devem exigir a rotulagem clara dos riscos, bem como a divulgação dos seus efeitos no sistema nervoso, e aplicar normas de design de jogos e normas de segurança, privacidade e adequação à idade.

Devem impedir a exploração da vulnerabilidade física, mental e emocional de uma pessoa para levar ao uso compulsivo ou ao vício em jogos ou plataformas digitais recreativas combinadas com neurotecnologia, de forma a promover um uso saudável e equilibrado, especialmente entre as crianças.

Manipulação

Outro ponto é a proibição do uso de neurotecnologia que influencia ou manipula indivíduos durante o sono, como o marketing durante o sono e os sonhos.

As regulamentações devem proibir estritamente aplicações comerciais, de marketing ou políticas que visem indivíduos durante o sono, utilizando neurotecnologia ou dados neurais, bem como dados neurais indiretos e dados não neurais que permitam inferências sobre estados mentais.

Além disso, mecanismos robustos de supervisão devem ser exigidos para garantir que qualquer pesquisa ou aplicação dessas tecnologias priorize o bem-estar, a privacidade e a autonomia dos indivíduos, com atenção especial aos potenciais impactos psicológicos e cognitivos a longo prazo da manipulação dos estados de sono.

Mariana Tokarnia – Repórter da Agência Brasil Publicado em 05/11/2025 – 14:58 Rio de Janeiro

Governo amplia mobilização de vacina contra HPV em jovens até dezembro

Meta é alcançar cerca de 7 milhões de jovens de 15 a 19 anos

O Ministério da Saúde ampliou até dezembro a mobilização para vacinar adolescentes com idade entre 15 e 19 anos contra o HPV. A meta é alcançar cerca de 7 milhões de jovens que perderam a imunização na idade recomendada, de 9 a 14 anos.

Em nota, a pasta informou que a estratégia conta com o apoio de estados e municípios e que, para facilitar o acesso, a dose está sendo ofertada em unidades básicas de saúde (UBS) e também em escolas, universidades, ginásios esportivos e shoppings.

“A vacina contra o HPV é segura e fundamental na prevenção de cânceres de colo do útero, vulva, pênis, garganta e pescoço. As ações de resgate buscam assegurar que todos os adolescentes e jovens dessa faixa etária sejam imunizados, garantindo um futuro mais saudável para as próximas gerações.”

Balanço

Dados do ministério apontam que, até o início do mês, mais de 115 mil adolescentes haviam sido imunizados nessa nova etapa da estratégia. Os estados com maior número de vacinados são Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo.

Em 2024, o Brasil registrou mais de 82% de cobertura vacinal contra o HPV entre meninas de 9 a 14 anos, índice acima da média global, de 37%. Entre meninos da mesma faixa etária, a cobertura foi de 67%

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Esquema vacinal

Desde o ano passado, o Brasil passou a adotar o esquema de dose única contra o HPV para crianças e adolescentes de 9 a 14 anos, substituindo o modelo anterior de duas doses. A medida, de acordo com o ministério, segue recomendações internacionais e reforça o compromisso do país de eliminar o câncer de colo do útero até 2030

Para pessoas imunocomprometidas, como as que vivem com HIV/aids e pacientes oncológicos e transplantados, o esquema contra o HPV permanece o de três doses. A mesma regra também vale para usuários de profilaxia pré-exposição (PrEP) com idade entre 15 e 45 anos e para vítimas de violência sexual a partir dos 15 anos.

Entenda

O HPV (papilomavírus humano) afeta pele e mucosas. Atualmente, figura como a infecção sexualmente transmissível mais comum em todo o mundo. Existem mais de 200 tipos de HPV – alguns podem causar verrugas genitais enquanto outros estão associados a tumores malignos, como o câncer do colo do útero, ânus, pênis, boca e garganta.

De acordo com o Ministério da Saúde, a vacinação, oferecida gratuitamente via Sistema Único de Saúde (SUS), é considerada a forma mais eficaz de prevenção do HPV, aliada ao uso de preservativos, que ajudam a reduzir o risco de contágio.

A infecção, na maioria das pessoas, não apresenta sintomas. Em alguns casos, o HPV pode ficar latente de meses a anos, sem manifestar sinais visíveis a olho nu ou subclínico.

As primeiras manifestações da infecção surgem, geralmente, entre dois e oito meses, mas pode demorar até 20 anos e costumam ser mais comuns em gestantes e em pessoas com baixa imunidade.

O diagnóstico é realizado por meio de exames clínicos e laboratoriais, dependendo do tipo de lesão.

Paula Laboissière – Repórter da Agência Brasil

Jovens são as maiores vítimas de violências e acidentes no Brasil

Um estudo epidemiológico sobre a situação de saúde da juventude brasileira revelou que a faixa etária é um fator de risco mais significativo do que a localização geográfica para violências e acidentes, tanto em áreas metropolitanas como em cidades do interior. Realizada pela Fiocruz, a pesquisa também indicou que jovens no final da adolescência (15 a 19 anos) sofrem mais violência no geral, especialmente física, além de serem mais vítimas em situações de conflitos; e que jovens de 20 a 24 anos, período em que costumam começar a trabalhar, estão mais sujeitos a uma morte violenta. 

Os pesquisadores utilizaram as bases de dados do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2022 e 2023, para determinar as taxas de mortalidade e incidência na população jovem entre 15 e 29 anos em todo o Brasil. De acordo com o levantamento da Agenda Jovem Fiocruz (AJF) e da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), a taxa de mortalidade por violências e acidentes entre jovens é maior do que a da população como um todo em todos os estados e no DF. Na maioria dos casos, essa diferença é maior que 50%. Na Paraíba, a diferença chega a 90%.

De acordo com a pesquisa, 65% dos óbitos da juventude resultam de causas externas, como violências e acidentes (84.034 das 128.826 mortes entre 2022 e 2023). A taxa de mortalidade por causas externas para jovens é de 185,5 mortes para cada 100 mil habitantes, maior do que a da população geral (149,7). A taxa é ainda mais alta em jovens entre 20 e 24 anos (218,2). Em contraste, essas causas representam apenas 10% do total de óbitos do conjunto da população brasileira. Mais de um terço dos casos de violência notificados no SUS vitimaram jovens (36%).

Segundo o coordenador da AJF, André Sobrinho, é importante não ver a juventude de maneira homogênea: “No curso da vida juvenil, as questões de saúde, incluindo as violências, incidem de maneira diferente se a pessoa jovem está no início, no meio ou no fim desse ciclo. É fundamental identificar, portanto, as necessidades em saúde mirando as distintas subfaixas de idade”, aponta.

Principais causas incluem armas de fogo, motocicletas e ação da polícia

Intitulado 1º Informe epidemiológico sobre a situação de saúde da juventude brasileira: violências e acidentes, o estudo apontou que a principal forma de violência sofrida por jovens brasileiros é a agressão física (47%), seguida da violência psicológica/moral (15,6%) e pela violência sexual (7,2%). Quanto mais velha a vítima, maior a proporção de violência psicológica. Quanto mais jovem, maior a proporção de violência física.

Armas de fogo e acidentes de motocicleta têm peso significativo nas causas de mortalidade juvenil, especialmente nos municípios localizados fora das regiões metropolitanas.

Os acidentes de transportes na juventude matam principalmente os homens, que representam 84% das vítimas. Na metade desses casos (53%), o meio de transporte foi a motocicleta. Ainda assim, a principal causa de morte violenta na juventude, seja para homens ou mulheres, são as agressões com armas de fogo.

Outra causa de morte que pesa muito mais na juventude é a intervenção legal, ou seja, a ação da polícia, que resulta em 3% dos óbitos por causas externas de jovens brasileiros. Esse valor é de apenas 1% dos óbitos totais da população. 

Regiões e estados brasileiros 

O levantamento ainda indicou que o maior risco de morte por violências e acidentes na juventude ocorre nos estados do Nordeste e do Norte, com destaque para a faixa entre 20 e 24 anos do Amapá (447 óbitos para cada 100 mil habitantes) e na Bahia (403).

As Unidades da Federação (UF) com as maiores taxas de violência por cem mil habitantes na juventude são o Distrito Federal (696,1), o Espírito Santo (637,8), o Mato Grosso do Sul (629,5) e Roraima (623,5). Na população brasileira como um todo, a taxa é de 250,6 para cada cem mil habitantes. 

Leia mais sobre o estudo:

Jovens negros são as principais vítimas de morte por violência

Publicado em 25/08/2025 08:52

Eric Andriolo (Agenda Jovem Fiocruz)